terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Pinheirinho, Cracolândia e USP: em vez de política, polícia! (Por Raquel Rolnik)

Pinheirinho, Cracolândia e USP: em vez de política, polícia!

23/01/12 por raquelrolnik


Domingo, 22 de janeiro de 2012, 6h da manhã, São José dos Campos (SP). Milhares de homens, mulheres, crianças e idosos moradores da ocupação Pinheirinho são surpreendidos por um cerco formado por helicópteros, carros blindados e mais de 1.800 homens armados da Polícia Militar. Além de terem sido interditadas as saídas da ocupação, foram cortados água, luz e telefone, e a ordem era que famílias se recolhessem para dar início ao processo de retirada. Determinados a resistir — já que a reintegração de posse havia sido suspensa na sexta feira – os moradores não aceitaram o comando, dando início a uma situação dramaticamente violenta que se prolongou durante todo o dia e que teve como resultado famílias desabrigadas, pessoas feridas, detenções e rumores, inclusive, sobre a existência de mortos.


Nos últimos 08 anos, os moradores da ocupação lutam pela sua permanência na área. Ao longo desse tempo, eles buscaram firmar acordos com instâncias governamentais para que fosse promovida a regularização fundiária da comunidade, contando para isto com o fato de que o terreno tem uma dívida milionária de IPTU com a prefeitura. O terreno pertence à massa falida da empresa Selecta, cujo proprietário é o especulador financeiro Naji Nahas, já investigado e temporariamente preso pela Polícia Federal na operação Satiagraha. No fim da semana, várias foram as idas e vindas judiciais favoráveis e contrárias à reintegração, assim como as tratativas entre governo federal, prefeitura, governo de Estado e parlamentares para encontrar uma saída pacífica para o conflito.Com o processo de negociação em curso e com posicionamentos contraditórios da Justiça, o governo do Estado decide armar uma operação de guerra para encerrar o assunto.



03 de janeiro de 2012, região da Luz, centro de São Paulo. A Polícia da Militar inicia uma ação de “limpeza” na região denominada pela prefeitura como Cracolândia. Em 14 dias de ação, mais de 103 usuários de drogas e frequentadores da região foram presos pela polícia com uso da cavalaria, spray de pimenta e muita truculência. Em seguida, mais de trinta prédios foram lacrados e alguns demolidos. Esta região é objeto de um projeto de “revitalização” por parte da prefeitura de São Paulo, que pretende concedê-la “limpinha” para a iniciativa privada construir torres de escritório e moradia e um teatro de ópera e dança no local. Moradores dos imóveis lacrados foram intimados a deixar a área mesmo sem ter para onde ir. Comerciantes que atuam no maior polo de eletroeletrônicos da América Latina, a Santa Efigênia , assim como os moradores que há décadas vivem ali, vêm tentando, desde 2010, bloquear a implantação deste projeto, já que este desconsidera absolutamente suas demandas.


08 de novembro de 2011, 05h10 da manhã, Cidade Universitária, São Paulo.Um policial aponta a arma para uma estudante de braços levantados, a tropa de choque entra no prédio e arromba portas (mesmo depois de a polícia já estar lá dentro), sem deixar ninguém mais entrar (nem a imprensa, diga-se de passagem), nem sair, tudo com muita truculência. Este foi o início do processo de desocupação da Reitoria da Universidade de São Paulo, ocupada por estudantes em protesto à presença da PM no Campus. Os estudantes são surpreendidos por um cerco formado pela tropa de choque e cavalaria, totalizando mais de 300 integrantes da Polícia Militar. Depois de horas de ação violenta, são retirados do prédio e levados presos mais de 73 estudantes. Camburão e helicópteros acompanham a ação.

O que estes três episódios recentes e lamentáveis têm em comum?

Os três eventos envolvem conflitos na gestão e ocupação do território. Os três são situações complexas, que demandariam um conjunto de políticas de curto, médio e longo prazo para serem enfrentados. Os três requerem um esforço enorme de mediação e negociação.
Entretanto, qual é a resposta para esta complexidade conflituosa? A violência, a supressão do diálogo, o acirramento do conflito.

Alguém poderia dizer — mas por quê os ocupantes do Pinheirinho resistiram? Por que não saíram imediatamente, evitando os feridos e as feridas da confrontação?

Porque sabem que, para quem foi “desocupado” ou” lacrado” nestas e outras reintegrações e “limpezas”, sobra a condição de sem-teto. Ou seja, para quem promoveu a reintegração ou a limpeza, o fundamental é ter o local vazio, e não o destino de quem estava lá, muitos menos as razões que levaram aquelas pessoas a estar lá naquela condição e seu enfrentamento e resolução. “Resolver” a questão é simplesmente fazer desaparecer o “problema” da paisagem.

Mais grave ainda, nestas situações a suposta “ilegalidade” ( ocupação de terra/uso de drogas) é motivo suficiente para promover todo e qualquer tipo de violação de leis e direitos em nome da ordem, em um retrocesso vergonhoso dos avanços da democracia no país.

Texto publicado originalmente no Yahoo! Colunistas.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

ALGUNS MASSACRES EM CURSO E A REAÇÃO DAS COMUNIDADES VIVAS

O ano começou daquele jeito para as trabalhadoras e os trabalhadores dos quatro cantos de São Paulo. No centro histórico, um incêndio criminoso dizimou centenas de barracos na Favela do Moinho, favela que na sequência foi golpeada também com a implosão do prédio que dá nome à comunidade.
Em seguida, a política de “dor e sofrimento”: a tortura “oficial” infligida aos usuários de crack parece ser o lema de boa parte das políticas “sociais” vigentes há tempos em São Paulo. Não pode ser outro o resultado quando naturalizamos os massacres, quando aceitamos que mais de uma centena de presos desarmados e rendidos sejam executados sem que os executores (e muito menos os mandantes do extermínio) sejam responsabilizados e punidos; quando aplaudimos um suposto “revide” a “ataques” contra o Estado, “revide” que vitimou centenas de pessoas, em geral condenadas à pena de morte sem julgamento simplesmente por serem pobres e negras; ou ainda quando poucos se levantam contra os incêndios criminosos que se multiplicam em favelas como estratégia de despejos, a serviço da especulação imobiliária.
A militarização da gestão pública, a criminalização da pobreza, o encarceramento em massa de comunidades pobres, o domínio absoluto dos Estados pelos grandes grupos econômicos: são todas políticas e processos irmanados e complementares que constituem vetores da perpetuação dos massacres que marcam nossa história.
O despejo que segue em curso na Favela do Moinho, a recém-deflagrada “operação” policial na Cracolândia e a invasão policial racista do espaço estudantil na USP pela PM são casos emblemáticos, cuja listagem infelizmente poderia ser ampliada indefinidamente.
No primeiro caso, um incêndio suspeito serve de pretexto para se realizar uma remoção há tanto tempo ensaiada de uma comunidade pobre, constituída principalmente por catadores de papel, que há pouco conseguiu usucapião do terreno localizado na região da Barra Funda (parte da cidade em que foi informalmente declarado que não se irá tolerar a existência de pobres). Como em dezenas de outros casos semelhantes, a alternativa oferecida pelo poder público aos moradores é uma bolsa-aluguel miserável e bastante limitada no tempo, o que revela a total ausência de uma política habitacional real.
No segundo caso, o da chamada Cracolândia, temos a expressão perfeita de uma questão social e de saúde pública da maior importância transformada em caso de polícia, tratada com repressão e com internação compulsória e tendo como pano de fundo a “revitalização” da região da Luz, ou seja, a valorização dos imóveis existentes e dos futuros empreendimentos imobiliários.
No caso mais recente, um estudante é agredido, ameaçado e humilhado por um policial pelo “crime” de ter sido confundido com um não-estudante, exatamente por ser negro. Uma manifestação particular, dentro da USP, de um comportamento racista que é regra cotidiana pelas periferias do país, sobretudo contra jovens pobres e negros. Apesar desse quadro terrível, essa série histórica de massacres tem provocado reações. Diversas organizações sociais estão realizando ações de denúncia, de resistência e de solidariedade, como é o caso do festival de rap Moinho Vivo que acontecerá neste Domingo (22/01), na Favela do Moinho.
A REDE 2 DE OUTUBRO adere a esses movimentos de resistência e reafirma o seu imenso repúdio a essas políticas de massacre e de higienização articuladas contra as populações mais vulneráveis e a favor dos interesses daqueles que há muito tiram seus altos lucros da exploração dessa vulnerabilidade.

REDE 2 DE OUTUBRO – PELO FIM DOS MASSACRES
http://rede2deoutubro.blogspot.com/

Hip Hop e resistência: Festival Moinho Vivo!

No dia 22/1, às 14h, acontecerá o 1º Festival Moinho Vivo, com a presença confirmada de vários nomes de peso do Hip Hop. Porém, mais que um encontro para celebrar a música que pulsa viva nas quebradas de São Paulo, o festival vem para marcar a luta de uma população marcada por um incêndio e uma implosão, bem como arrecadar roupas, remédios e alimentos para a comunidade do moinho.

Vamos apoiar e divulgar!

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A sombra do Massacre em Pinheirinho!

Mesmo depois do banho de água fria que veio com a decisão da Justiça Federal de reverter a sua decisão anterior, que suspendia a realização iminente da reintegração de posse, os moradores do Pinheirinho continuam em alerta máximo para defender sua moradias e fazem um chamado para que todos e todas colaborem nessa resistência!

Como se já não fosse suficientemente revoltante o Estado colocar a propriedade privada acima da vida e dignidade de milhares de famílias, os contornos violentos que a desocupação vem assumindo é extremamente preocupante e mostra que a "política do massacre", como instrumento de manutenção da ordem e controle social, continua viva e presente.

Dos vitimados pela a ditadura militar, passando pelos 111 mortos (identificados) no Carandiru, pelos assassinatos em Carajás e o extermínio de centenas pessoas nos Crimes de Maio, vemos que a mesma sede de brutalidade continua, e agora lança seus olhos sobre Pinheirinho. Não podemos deixar que massacrem a vida e a dignidade dessas pessoas!

Pelo fim dos massacres! Todo apoio à luta do Pinheirinho!

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Vídeo do Ato - 2 de Outubro de 2011

Eis o vídeo do Ato do dia 2 de Outubro, que marcou os 19 anos do Massacre do Carandiru, e o início da Campanha pelo Fim dos Massacres, organizada pela Rede 2 de Outubro. Ao longo do ano, realizaremos uma série de atividades buscando tematizar e refletir sobre questões como a do encarceramento em massa, que se acelera pelo país, a das chacinas que se repetem, a das características e das funções dos sistemas penal e prisional, bem como das políticas públicas de "segurança", entre outras. Tais atividades servirão de base para a criação de um Fórum, que realizaremos em agosto, e para o grande Ato que faremos no próximo dia 2 de Outubro, em função dos 20 anos do Massacre do Carandiru.