segunda-feira, 22 de abril de 2013

MAIS DE 50 ORGANIZAÇÕES E MOVIMENTOS ASSINAM NOTA PELA CÉLERE APROVAÇÃO DO PL 4471!



Amanhã, será votado na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) parecer favorável à aprovação do projeto de lei 4471, pela extinção dos autos de resistência!


Estaremos atentos no quórum e no posicionamento d@s parlamentares!


NOTA PÚBLICA PELA CÉLERE APROVAÇÃO DO PROJETO DE LEI 4471/2012.

O Projeto de Lei 4471/2012 tem como objeto a alteração do Código de Processo Penal (artigos 161, 162, 164, 165, 169 e 292) para, a partir de medidas normativas entornadas a garantir a exaustiva apuração de casos de letalidade derivada do emprego da força policial, extirpar de vez do cotidiano policial as figuras da “resistência seguida de morte” e dos “autos de resistência”.

Já há muito movimentos e organizações sociais – sobretudo aqueles formados por familiares de vítimas da violência estatal – se mobilizam contra os diversos casos de execuções que sequer chegam a ser apuradas, sob a obscura premissa de que os policiais agem em legítima defesa e, portanto, restaria excluída a ilicitude da ação, independentemente de investigação ou de apreciação pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário.

Apesar da “redemocratização” do país, centenas de milhares de familiares seguiram (e seguem) a padecer com as mortes de seus entes queridos, as quais, decorrentes de ações policiais, não são, na maioria das vezes, investigadas.

Para além dos casos que ocorrem cotidianamente sem qualquer repercussão pública, são inúmeras as notórias chacinas com participação policial ocorridas dos anos 90 até a atualidade: Acari (1990); Matupá (1991); Massacre do Carandiru (1992); Candelária e Vigário Geral (1993); Alto da Bondade (1994); Corumbiara (1995); Eldorado dos Carajás (1996); São Gonçalo e da Favela Naval (1997); Alhandra e Maracanã (1998); Cavalaria e Vila Prudente (1999); Jacareí (2000); Caraguatatuba (2001); Castelinho, Jd. Presidente Dutra e Urso Branco (2002); Amarelinho, Via Show e Borel (2003); Unaí, Caju, Praça da Sé e Felisburgo (2004); Baixada Fluminense (2005); Crimes de Maio (2006); Complexo do Alemão (2007); Morro da Providência (2008); Canabrava (2009); Vitória da Conquista e os Crimes de Abril na Baixada Santista (2010); Praia Grande (2011); Massacre do Pinheirinho, de Saramandaia, da Aldeia Teles Pires, os Crimes de junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro, dezembro (2012), Chacina do Jardim Rosana (2013)…

Aponta-se que, entre janeiro de 2010 e junho de 2012, apenas nos estados do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina, 2.882 pessoas foram mortas em ações registradas como “autos de resistência” ou “resistência seguida de morte”[1]– média de mais de 3 execuções por dia!

No estado da Bahia, entre os meses de janeiro e agosto de 2012, foram registradas 267 mortes de pessoas supostamente envolvidas em confrontos com policiais – média de mais de uma execução por dia![2].

A execrável prática, desprovida de qualquer amparo legal, está na contramão da Constituição da República ao representar afronta ao fundamento da dignidade humana (art. 1º, III), à primazia dos direitos humanos (art. 4º, II) e, especificamente, ao direito fundamental à vida e à integridade física (art. 5º, caput e inciso III). Em última análise, atenta contra o Estado de Direito ao legitimar uma prática claramente ilegal.

Mais: trata-se de prática em inequívoca incompatibilidade com os compromissos firmados pelo País em tratados internacionais.

Consoante Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (Parte II, art. 2º, item 3, e art. 6º, item 1) e o Pacto de São José da Costa Rica (art. 25), deve ser garantida a investigação de qualquer violação a direitos humanos.

De modo mais específico, os “Princípios das Nações Unidas para a prevenção efetiva e investigação de execuções sumárias, arbitrárias e extralegais” impõem ao Governo o dever de proibir “por lei toda e qualquer execução sumária, arbitrária e extralegal”, garantindo “controle rigoroso, incluindo uma hierarquia clara de comando sobre todos os oficiais responsáveis por apreensão, custódia e encarceramento, assim como oficiais autorizados por lei a usarem a força e armas de fogo”.

Sobre a investigação desses casos, o mesmo documento internacional dispõe que “deve haver uma investigação completa, imediata e imparcial de todos os casos suspeitos de execução sumária, arbitrária e extralegal, inclusive de casos em que a queixa de parentes ou outros relatos confiáveis sugiram óbito por razões anormais nessas circunstâncias”.

É importante salientar que as milhares de execuções cometidas por policiais e não investigadas pelo artifício dos “autos de resistência” ou “resistência seguida de morte” têm como alvo quase que exclusivo jovens pobres e negros moradores das periferias das cidades brasileiras.

Trata-se, na prática, de odioso genocídio contra a população negra, jovem e pobre, presente desde a escravatura e confirmada pelo recentemente divulgado “Mapa da Violência 2012 – A Cor dos Homicídios no Brasil”, segundo o qual, no Brasil, entre 2002 e 2010, o número de homicídios de brancos caiu 25,5% ao passo que o de negros aumentou 29,8%[3].

A cada 10 jovens assassinados no Brasil, 7 são negros!

Sobre a “tendência crescente dessa mortalidade seletiva”, afirma-se no documento: “a tendência geral é de queda no número absoluto de homicídios na população branca e de aumento na população negra”.

Bom lembrar que o Brasil também é signatário da “Convenção Para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio”, que considera genocídio, entre outras hipóteses, assassinatos cometidos “com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso”.

Frente aos dados expostos e ao conhecido histórico de 388 anos de escravidão e posterior marginalização e perseguição da população negra formalmente liberta, inevitável enquadrar a situação como caso típico de genocídio, nos termos da aludida hipótese.

Nesse sentido, afirma Ana Flauzina[4] que “a forma de movimentação do sistema penal brasileiro, fundamentada na violência e na produção de mortes, tem o racismo como variável central”.

Segundo Flauzina:

Aqui, o genocídio está na base de um projeto de Estado assumido desde a abolição da escravatura, com a qual nunca se romperá efetivamente. A agenda genocida é recepcionada pelos sucessivos governos que assumiram a condução do país desde então, sem que se alterassem os termos desse pacto. Daí a grande dificuldade de ter acesso ao projeto: ele não é episódico, mas estrutural.

Assim, àquelas e àqueles engajados na construção de um Estado realmente Democrático e de Direito, livre de genocídios, resta concluir não apenas pela manifesta plausibilidade do PL 4471/2012, mas também pela urgência de sua aprovação diante do cenário de ascendente violência policial por todo país.

A proposição torna-se ainda mais relevante diante da recente aprovação, pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), daResolução8/2012, que prevê a substituição dos termos “autos de resistência” e “resistência seguida de morte” por “lesão corporal decorrente de intervenção policial” ou “morte decorrente de intervenção policial” e determina que os casos devem ser investigados pela Delegacia de Crimes contra a Pessoa ou por uma delegacia com atribuição similar.

Diante do descalabro representado no genocídio histórico da população negra, impõe-se a todas e todos parlamentares a tarefa de aprovar, celeremente, essa importante lei que, ao encontro das disposições contidas na Constituição da República e dos compromissos internacionais para a promoção de direitos humanos firmados pelo Brasil,  extinguirá as obscuras figuras dos “autos de resistência” e “resistência seguida de morte” e contribuirá para a desestruturação da política genocida que permeia o sistema penal brasileiro.

Por essas razões, as organizações, órgãos e movimentos subscritos requerem seja o PL 4471/2012 aprovado celeremente, possibilitando-se a ampliação do controle sobre a atividade policial e, espera-se, a redução substancial dos casos de execuções cometidas por policiais.

ASSINAM:

Ação dos Cristãos Para Abolição da Tortura(ACAT-BRASIL)
Ação Educativa - Assessoria, Informação e Pesquisa
Associação Amparar
Associação das/os Pós-graduandas/os da USP/Capital Helenira "Preta" Rezende (APG Helenira 'Preta' Rezende – USP/Capital)
Associação dos Servidores do IBGE de São Paulo (SSIBGE/SP)
Associação Juízes Para a Democracia (AJD)
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescentes (ANCED– Seção DCI Brasil)
Associação Paulista de Defensores Públicos (APADEP)
Associação Pela Reforma Prisional (ARP)
Brigadas Populares
Campanha Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta
Centro de Direitos Humanos e de Educação Popular Campo Limpo (CDHEP)
Centro de Direitos Humanos Sapopemba (CDHS)
Círculo Palmarino
Coletivo Contra a Tortura
Coletivo Merlino
Comitê Contra o Genocídio da Juventude Negra
Conectas Direitos Humanos
Consulta Popular
Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN)
Cursinho Comunitário Jardim Pantanal
Escola de Governo
Fórum de HIP HOP –SP
Fórum de HIP HOP Municipal– SP
Instituto de Defensores de Direitos Humanos (IDDH)
Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)
Instituto de Estudos da Religião (ISER)
Instituto Luiz Gama
Instituto Paulista da Juventude
Instituto Práxis de Direitos Humanos
Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC)
Justiça Global
Levante Popular da Juventude
Luta Popular
Mães de Maio
Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST)
Movimento Negro Unificado (MNU)
Núcleo de Consciência Negra na USP
Núcleo de Estudos da Violência (NEV-USP)
Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Observatório das Violências Policiais - CEHAL-PUC/SP
Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Pastoral Carcerária – CNBB
Pastoral Carcerária do Estado de São Paulo - CNBB Sul I
Pastoral da Juventude da Arquidiocese de São Paulo
Pastoral da Juventude do Regional Sul 1 – CNBB
Rede de Comunidades do Extremo Sul
Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
Rede 2 de Outubro
Rede Rua
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
Revista Crítica do Direito
Serviço Franciscano de Solidariedade (SEFRAS)
Setor de Direitos Humanos do MST
Setorial Nacional de Negras e Negros da Central de Movimentos Populares do Brasil (CMP)
Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo
Terra Livre – Movimento Popular do Campo e da Cidade
Tribunal Popular: O Estado Brasileiro no Banco do Réus

União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe Trabalhadora (UNEafro Brasil)

quarta-feira, 10 de abril de 2013

QUEM JULGA O SISTEMA PENAL?

 


NOTA DA REDE 2 DE OUTUBRO: QUEM JULGA O SISTEMA PENAL?

Após o adiamento da última segunda-feira, terá início, no próximo dia 15 de abril, o julgamento dos policiais militares acusados de matar pelo menos 111 homens na implodida Casa de Detenção do Carandiru, episódio que ficou conhecido como “Massacre do Carandiru”. É compreensível que aquelas e aqueles que refutam a história oficial e que o denunciam como chacina clamem agora por “justiça” e exijam do Estado a responsabilização dos envolvidos no Massacre.
No entanto, devemos lembrar que esse mesmo Estado, ora chamado a “fazer justiça”, é peça fundamental na estrutura social que permitiu a ocorrência do Massacre do Carandiru e de tantos outros massacres que marcaram (e ainda marcam) a nossa história.
No contexto desse julgamento, cumpre-nos, sem dúvida, mais uma vez, desconstruir a versão oficial de que o episódio foi mero ato de contenção de uma rebelião e desvelar que os (ao menos) 111 homens, em sua maioria jovens e negros, desarmados e indefesos, foram cruelmente exterminados, com autorização vinda diretamente do gabinete do Governador.
Mais do que isso, porém, é fundamental revelar e enfrentar a dinâmica social que produziu esse Massacre e que se aperfeiçoou desde então. A chacina ocorrida em 2 de outubro de 1992 não é um fato isolado na história do Brasil: o Massacre do Carandiru insere-se numa longa trajetória de massacres que fundaram o país – extermínio dos povos indígenas e escravização dos povos africanos - e que constituem o cotidiano do povo pobre e negro que habita estas terras.
Expressão e resultado de um intenso e violento processo contra uma parcela da população, em sua maioria negra, o Massacre do Carandiru marca ainda o início de um processo de encarceramento em massa, mecanismo essencial da engrenagem da política neoliberal adotada pelos governos brasileiros a partir da década de 90.
A pretexto de resolver os problemas da superlotação prisional e das péssimas condições de encarceramento que teriam levado à rebelião na Casa de Detenção do Carandiru, iniciou-se uma política de construção e interiorização de presídios, que se generalizou por todo o país. O resultado foi a explosão da população prisional brasileira. O número de pessoas presas saltou de 90 mil, em 1990, para 550 mil, em 2012. O Brasil sextuplicou a população encarcerada num período aproximado de 20 anos, crescimento sem precedentes mesmo entre os três países com maior população prisional (o Brasil é o 4º no ranking).
Mais de meio milhão da população brasileira vive, portanto, sob a prática constante e sistemática da tortura física e psicológica, inerente à privação de liberdade e à disciplina penitenciária.
A maior parte da população amontoada nos superlotados e degradantes presídios brasileiros é negra (60%). Cerca de 80% da população prisional está presa por crimes contra o patrimônio ou tráfico de drogas, condutas imputadas às pessoas pobres para quem resta ou procurar um ofício miserável dentro da legalidade ou se socorrer de caminhos informais (e ficar ainda mais vulnerável ao aparato repressor).
Apesar de a grande maioria (93%) da população encarcerada ser formada por homens, o crescimento da população prisional feminina é superior à masculina. Desde 2006, em razão do recrudescimento da Lei de Drogas, o Brasil vem encarcerando em massa mulheres cujo perfil (jovens, pobres e negras, principais ou exclusivas responsáveis pelo sustento da família) revela o caráter patriarcal do processo de criminalização sobre elas.
E o massacre continua. Estima-se que pelo menos mais meio milhão de pessoas (pobres) esteja vivendo sob a égide da violência penal do Estado Brasileiro que extrapola os muros dos cárceres. Ensinadas ou responsabilizadas desde pequena aos cuidados com o outro, são elas, mães, esposas e irmãs, que amenizam o sofrimento cotidiano de seus entes queridos, sendo expropriadas e violadas ao empregarem seus esforços, suas economias e seus corpos no périplo do dia de visita e na busca do alvará de soltura.
A ordem para esse encarceramento seletivo e em massa é complementar à ordem, muitas vezes expressa, para matar. A autorização para executar a população pobre, jovem e negra que povoava o Carandiru naquele 2 de outubro não se encerrou ali e não cessará com o julgamento dos PMs.
O genocídio da população pobre e preta, que deita suas raízes no período escravocrata, segue como pilar das gestões que sucederam à de Fleury e como pressuposto da manutenção de uma sociedade extremamente desigual, em que poucos se fartam com a exploração de muitos. No Brasil, a cada 10 jovens assassinados, 7 são negros!
Por todas essas razões, ainda que julguemos fundamental a responsabilização dos policiais envolvidos e do mandatário do Massacre, Antônio Fleury Filho, a derrocada dessa ordem que se sustenta a partir do extermínio do povo pobre e negro, nos dois lados do muro, e no dia a dia, e da qual o Massacre do Carandiru é produto e expressão, somente se dará com a organização e a luta popular contra esse Estado Penal e contra as classes abastadas que dele se valem para manter seus domínios.

REDE 2 DE OUTUBRO
PELO FIM DOS MASSACRES

sexta-feira, 5 de abril de 2013

NOTA DA REDE 2 DE OUTUBRO: QUEM JULGA O SISTEMA PENAL?



NOTA DA REDE 2 DE OUTUBRO: QUEM JULGA O SISTEMA PENAL?

No próximo dia 8 de abril, terá início o julgamento dos policiais militares acusados de matar pelo menos 111 homens na implodida Casa de Detenção do Carandiru, episódio que ficou conhecido como “Massacre do Carandiru”. É compreensível que aquelas e aqueles que refutam a história oficial e que o denunciam como chacina clamem agora por “justiça” e exijam do Estado a responsabilização dos envolvidos no Massacre.
No entanto, devemos lembrar que esse mesmo Estado, ora chamado a “fazer justiça”, é peça fundamental na estrutura social que permitiu a ocorrência do Massacre do Carandiru e de tantos outros massacres que marcaram (e ainda marcam) a nossa história.
No contexto desse julgamento, cumpre-nos, sem dúvida, mais uma vez, desconstruir a versão oficial de que o episódio foi mero ato de contenção de uma rebelião e desvelar que os (ao menos) 111 homens, em sua maioria jovens e negros, desarmados e indefesos, foram cruelmente exterminados, com autorização vinda diretamente do gabinete do Governador.
Mais do que isso, porém, é fundamental revelar e enfrentar a dinâmica social que produziu esse Massacre e que se aperfeiçoou desde então. A chacina ocorrida em 2 de outubro de 1992 não é um fato isolado na história do Brasil: o Massacre do Carandiru insere-se numa longa trajetória de massacres que fundaram o país – extermínio dos povos indígenas e escravização dos povos africanos - e que constituem o cotidiano do povo pobre e negro que habita estas terras.
Expressão e resultado de um intenso e violento processo contra uma parcela da população, em sua maioria negra, o Massacre do Carandiru marca ainda o início de um processo de encarceramento em massa, mecanismo essencial da engrenagem da política neoliberal adotada pelos governos brasileiros a partir da década de 90.
A pretexto de resolver os problemas da superlotação prisional e das péssimas condições de encarceramento que teriam levado à rebelião na Casa de Detenção do Carandiru, iniciou-se uma política de construção e interiorização de presídios, que se generalizou por todo o país. O resultado foi a explosão da população prisional brasileira. O número de pessoas presas saltou de 90 mil, em 1990, para 550 mil, em 2012. O Brasil sextuplicou a população encarcerada num período aproximado de 20 anos, crescimento sem precedentes mesmo entre os três países com maior população prisional (o Brasil é o 4º no ranking).
Mais de meio milhão da população brasileira vive, portanto, sob a prática constante e sistemática da tortura física e psicológica, inerente à privação de liberdade e à disciplina penitenciária.
A maior parte da população amontoada nos superlotados e degradantes presídios brasileiros é negra (60%). Cerca de 80% da população prisional está presa por crimes contra o patrimônio ou tráfico de drogas, condutas imputadas às pessoas pobres para quem resta ou procurar um ofício miserável dentro da legalidade ou se socorrer de caminhos informais (e ficar ainda mais vulnerável ao aparato repressor).
Apesar de a grande maioria (93%) da população encarcerada ser formada por homens, o crescimento da população prisional feminina é superior à masculina. Desde 2006, em razão do recrudescimento da Lei de Drogas, o Brasil vem encarcerando em massa mulheres cujo perfil (jovens, pobres e negras, principais ou exclusivas responsáveis pelo sustento da família) revela o caráter patriarcal do processo de criminalização sobre elas.
E o massacre continua. Estima-se que pelo menos mais meio milhão de pessoas (pobres) esteja vivendo sob a égide da violência penal do Estado Brasileiro que extrapola os muros dos cárceres. Ensinadas ou responsabilizadas desde pequena aos cuidados com o outro, são elas, mães, esposas e irmãs, que amenizam o sofrimento cotidiano de seus entes queridos, sendo expropriadas e violadas ao empregarem seus esforços, suas economias e seus corpos no périplo do dia de visita e na busca do alvará de soltura.
A ordem para esse encarceramento seletivo e em massa é complementar à ordem, muitas vezes expressa, para matar. A autorização para executar a população pobre, jovem e negra que povoava o Carandiru naquele 2 de outubro não se encerrou ali e não cessará com o julgamento dos PMs.
O genocídio da população pobre e preta, que deita suas raízes no período escravocrata, segue como pilar das gestões que sucederam à de Fleury e como pressuposto da manutenção de uma sociedade extremamente desigual, em que poucos se fartam com a exploração de muitos. No Brasil, a cada 10 jovens assassinados, 7 são negros!
Por todas essas razões, ainda que julguemos fundamental a responsabilização dos policiais envolvidos e do mandatário do Massacre, Antônio Fleury Filho, a derrocada dessa ordem que se sustenta a partir do extermínio do povo pobre e negro, nos dois lados do muro, e no dia a dia, e da qual o Massacre do Carandiru é produto e expressão, somente se dará com a organização e a luta popular contra esse Estado Penal e contra as classes abastadas que dele se valem para manter seus domínios.

REDE 2 DE OUTUBRO
PELO FIM DOS MASSACRES