Amanhã, será votado na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) parecer favorável à aprovação do projeto de lei 4471, pela extinção dos autos de resistência!
Estaremos atentos no quórum e no posicionamento d@s parlamentares!
NOTA PÚBLICA PELA CÉLERE APROVAÇÃO DO PROJETO DE LEI 4471/2012.
O Projeto de Lei
4471/2012 tem como objeto a alteração do Código de Processo Penal (artigos 161,
162, 164, 165, 169 e 292) para, a partir de medidas normativas entornadas a
garantir a exaustiva apuração de casos de letalidade derivada do emprego da
força policial, extirpar de vez do
cotidiano policial as figuras da “resistência seguida de morte” e dos “autos de
resistência”.
Já há muito
movimentos e organizações sociais – sobretudo aqueles formados por familiares
de vítimas da violência estatal – se mobilizam contra os diversos casos de
execuções que sequer chegam a ser apuradas, sob a obscura premissa de que os
policiais agem em legítima defesa e, portanto, restaria excluída a ilicitude da
ação, independentemente de investigação ou de apreciação pelo Ministério
Público e pelo Poder Judiciário.
Apesar da
“redemocratização” do país, centenas de milhares de familiares seguiram (e
seguem) a padecer com as mortes de seus entes queridos, as quais, decorrentes
de ações policiais, não são, na maioria das vezes, investigadas.
Para além dos
casos que ocorrem cotidianamente sem qualquer repercussão pública, são inúmeras
as notórias chacinas com participação policial ocorridas dos anos 90 até a
atualidade: Acari (1990); Matupá (1991); Massacre do Carandiru (1992); Candelária
e Vigário Geral (1993); Alto da Bondade (1994); Corumbiara (1995); Eldorado dos
Carajás (1996); São Gonçalo e da Favela Naval (1997); Alhandra e Maracanã
(1998); Cavalaria e Vila Prudente (1999); Jacareí (2000); Caraguatatuba (2001);
Castelinho, Jd. Presidente Dutra e Urso Branco (2002); Amarelinho, Via Show e
Borel (2003); Unaí, Caju, Praça da Sé e Felisburgo (2004); Baixada Fluminense
(2005); Crimes de Maio (2006); Complexo do Alemão (2007); Morro da Providência
(2008); Canabrava (2009); Vitória da Conquista e os Crimes de Abril na Baixada
Santista (2010); Praia Grande (2011); Massacre do Pinheirinho, de Saramandaia,
da Aldeia Teles Pires, os Crimes de junho, julho, agosto, setembro, outubro,
novembro, dezembro (2012), Chacina do Jardim Rosana (2013)…
Aponta-se que, entre janeiro de 2010 e junho de 2012, apenas nos
estados do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina,
2.882 pessoas foram mortas em ações registradas como “autos de resistência” ou
“resistência seguida de morte”[1]–
média de mais de 3 execuções por dia!
No estado da Bahia, entre os meses de janeiro e agosto de 2012,
foram registradas 267 mortes de pessoas supostamente envolvidas em confrontos
com policiais – média de mais de uma execução por dia![2].
A execrável prática,
desprovida de qualquer amparo legal, está na contramão da Constituição da República ao representar afronta ao fundamento da
dignidade humana (art. 1º, III), à primazia dos direitos humanos (art. 4º, II)
e, especificamente, ao direito fundamental à vida e à integridade física (art.
5º, caput e inciso III). Em última análise, atenta contra o Estado de Direito ao legitimar uma prática claramente
ilegal.
Mais: trata-se de prática em inequívoca incompatibilidade com
os compromissos firmados pelo País em tratados internacionais.
Consoante Pacto Internacional dos Direitos Civis e
Políticos (Parte II, art. 2º, item 3, e art. 6º, item 1) e o Pacto de São José da Costa Rica (art.
25), deve ser garantida a investigação de qualquer violação a direitos humanos.
De modo mais
específico, os “Princípios das Nações
Unidas para a prevenção efetiva e investigação de execuções sumárias,
arbitrárias e extralegais” impõem ao Governo o dever de proibir “por lei
toda e qualquer execução sumária, arbitrária e extralegal”, garantindo
“controle rigoroso, incluindo uma hierarquia clara de comando sobre todos os
oficiais responsáveis por apreensão, custódia e encarceramento, assim como
oficiais autorizados por lei a usarem a força e armas de fogo”.
Sobre a investigação desses casos, o mesmo documento internacional dispõe que
“deve haver uma investigação completa, imediata e imparcial de todos os casos
suspeitos de execução sumária, arbitrária e extralegal, inclusive de casos em
que a queixa de parentes ou outros relatos confiáveis sugiram óbito por razões
anormais nessas circunstâncias”.
É importante
salientar que as milhares de execuções cometidas por policiais e não
investigadas pelo artifício dos “autos de resistência” ou “resistência seguida
de morte” têm como alvo quase que exclusivo
jovens pobres e negros moradores das periferias das cidades brasileiras.
Trata-se, na
prática, de odioso genocídio contra a
população negra, jovem e pobre, presente desde a escravatura e confirmada
pelo recentemente divulgado “Mapa da Violência 2012 – A Cor dos Homicídios no
Brasil”, segundo o qual, no Brasil, entre
2002 e 2010, o número de homicídios de brancos caiu 25,5% ao passo que o de
negros aumentou 29,8%[3].
A cada 10 jovens assassinados no Brasil, 7 são negros!
Sobre a “tendência
crescente dessa mortalidade seletiva”, afirma-se no documento: “a tendência
geral é de queda no número absoluto de homicídios na população branca e de
aumento na população negra”.
Bom lembrar que o
Brasil também é signatário da “Convenção
Para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio”, que considera
genocídio, entre outras hipóteses, assassinatos cometidos “com a intenção de
destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso”.
Frente aos dados
expostos e ao conhecido histórico de 388 anos de escravidão e posterior
marginalização e perseguição da população negra formalmente liberta, inevitável
enquadrar a situação como caso típico de genocídio,
nos termos da aludida hipótese.
Nesse sentido,
afirma Ana Flauzina[4]
que “a forma de movimentação do sistema penal brasileiro, fundamentada na
violência e na produção de mortes, tem o racismo como variável central”.
Segundo Flauzina:
Aqui, o genocídio está na base
de um projeto de Estado assumido desde a abolição da escravatura, com a qual
nunca se romperá efetivamente. A agenda genocida é recepcionada pelos
sucessivos governos que assumiram a condução do país desde então, sem que se
alterassem os termos desse pacto. Daí a grande dificuldade de ter acesso ao
projeto: ele não é episódico, mas estrutural.
Assim, àquelas e
àqueles engajados na construção de um Estado
realmente Democrático e de Direito, livre de genocídios, resta concluir não
apenas pela manifesta plausibilidade do PL 4471/2012, mas também pela urgência
de sua aprovação diante do cenário de ascendente violência policial por todo
país.
A proposição
torna-se ainda mais relevante diante da recente aprovação, pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa
Humana (CDDPH), da Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), daResolução8/2012, que prevê a
substituição dos termos “autos de resistência” e “resistência seguida de morte”
por “lesão corporal decorrente de intervenção policial” ou “morte decorrente de
intervenção policial” e determina que os casos devem ser investigados pela
Delegacia de Crimes contra a Pessoa ou por uma delegacia com atribuição
similar.
Diante do descalabro representado no genocídio histórico da
população negra, impõe-se a todas e todos parlamentares a tarefa de aprovar,
celeremente, essa importante lei que, ao encontro das disposições contidas na
Constituição da República e dos compromissos internacionais para a promoção de
direitos humanos firmados pelo Brasil,
extinguirá as obscuras figuras dos “autos de resistência” e “resistência
seguida de morte” e contribuirá para a desestruturação da política genocida que
permeia o sistema penal brasileiro.
Por essas razões, as organizações, órgãos e movimentos subscritos
requerem seja o PL 4471/2012 aprovado celeremente, possibilitando-se a
ampliação do controle sobre a atividade policial e, espera-se, a redução
substancial dos casos de execuções cometidas por policiais.
ASSINAM:
Ação dos Cristãos Para Abolição da Tortura(ACAT-BRASIL)
Ação Educativa - Assessoria, Informação e Pesquisa
Associação Amparar
Associação das/os Pós-graduandas/os da USP/Capital Helenira
"Preta" Rezende (APG Helenira 'Preta' Rezende – USP/Capital)
Associação dos Servidores do IBGE de São Paulo (SSIBGE/SP)
Associação Juízes Para a Democracia (AJD)
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do
Adolescentes (ANCED– Seção DCI Brasil)
Associação Paulista de Defensores Públicos (APADEP)
Associação Pela Reforma Prisional (ARP)
Brigadas Populares
Campanha Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta
Centro de Direitos Humanos e de Educação Popular Campo Limpo
(CDHEP)
Centro de Direitos Humanos Sapopemba (CDHS)
Círculo Palmarino
Coletivo Contra a Tortura
Coletivo Merlino
Comitê Contra o Genocídio da Juventude Negra
Conectas Direitos Humanos
Consulta Popular
Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN)
Cursinho Comunitário Jardim Pantanal
Escola de Governo
Fórum de HIP HOP –SP
Fórum de HIP HOP Municipal– SP
Instituto de Defensores de Direitos Humanos (IDDH)
Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD)
Instituto de Estudos da Religião (ISER)
Instituto Luiz Gama
Instituto Paulista da Juventude
Instituto Práxis de Direitos Humanos
Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC)
Justiça Global
Levante Popular da Juventude
Luta Popular
Mães de Maio
Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST)
Movimento Negro Unificado (MNU)
Núcleo de Consciência Negra na USP
Núcleo de Estudos da Violência (NEV-USP)
Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria
Pública do Estado de São Paulo
Observatório das Violências Policiais - CEHAL-PUC/SP
Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Pastoral Carcerária – CNBB
Pastoral Carcerária do Estado de São Paulo - CNBB Sul I
Pastoral da Juventude da Arquidiocese de São Paulo
Pastoral da Juventude do Regional Sul 1 – CNBB
Rede de Comunidades do Extremo Sul
Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
Rede 2 de Outubro
Rede Rua
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
Revista Crítica do Direito
Serviço Franciscano de Solidariedade (SEFRAS)
Setor de Direitos Humanos do MST
Setorial Nacional de Negras e Negros da Central de Movimentos
Populares do Brasil (CMP)
Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo
Terra Livre – Movimento Popular do Campo e da Cidade
Tribunal Popular: O Estado Brasileiro no Banco do Réus
União de Núcleos de Educação Popular para Negras/os e Classe
Trabalhadora (UNEafro Brasil)
[4]FLAUZINA,
Ana Luíza Pinheiro. Corpo Negro Caído no Chão: O Sistema Penal e o Projeto
Genocida do Estado Brasileiro. Dissertação apresentada à Universidade de
Brasília, para obtenção do título de Mestre em Direito. Brasília, 2006.
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