A LUTA PELO FIM DOS MASSACRES NÃO CABE NOS TRIBUNAIS.
Na madrugada do último sábado, foi
proferida a condenação de 25 policiais da Rota pela execução, em 2 de outubro
de 1992, de 52 homens presos no 3º andar da Casa de Detenção do Carandiru.
Apesar de se tratar de notícia
importante, que revela a confirmação por júri popular, ainda que mais de 20
anos depois, do Massacre do Carandiru e a responsabilização de parte dos
policiais participantes da chacina, não podemos, ingenuamente, achar que a
“justiça foi feita”.
Como já afirmamos em nota publicada
quando do início do julgamento da primeira leva de policiais (abril), é preciso
lembrar que esse mesmo Estado, ora chamado a “fazer justiça”, é peça fundamental
na estrutura social que permitiu a ocorrência do Massacre do Carandiru e de
tantos outros massacres que marcaram (e ainda marcam) a nossa história.
Enquanto os 25 policiais da Rota, 20
anos depois da maior chacina da história do sistema prisional brasileiro, eram
julgados no subterrâneo do Fórum da Barra Funda, nos dois andares superiores
centenas de jovens, pobres e pretos eram sumariamente condenados ao cumprimento
de longas penas em prisões onde ficarão apinhados em celas superlotadas, sem
qualquer estrutura para acolher seres humanos, em verdadeiros moinhos de
massacrar gente.
Tanto esses jovens como os policiais da
Rota fazem parte, em graus diferentes, da mesma seletividade que caracteriza o
sistema penal: enquanto os policiais são julgados sem a presença de seus
mandatários, o Governador da época, Luís Antônio Fleury Filho, e o Secretário
de Segurança, Pedro Campos, as centenas de milhares de jovens que superlotam os
presídios brasileiros são alvo de um sistema que ignora amplamente a
criminalidade cometida pelas classes sociais mais abastadas ao passo que
persegue e criminaliza implacavelmente as classes mais pobres.
Obviamente, as semelhanças param por aí:
enquanto os policiais da Rota tiveram e terão a “colher-de-chá” de responder o
processo em liberdade até o julgamento do último recurso, a juventude pobre e
preta alvejada pelo sistema penal começa a cumprir pena desde a prisão em
flagrante, independentemente da presunção de inocência, garantia constitucional
que deveria, em tese, ser observada em ambos os casos.
Vale ainda lembrar que entre os
policiais condenados está Salvador Modesto Madia, até pouco tempo comandante da
Rota nomeado pelo Governador Geraldo Alckmin. A Rota, apesar de não chegar a
corresponder a 0,5% de todo o efetivo da Polícia Militar, é responsável por
cerca de 20% dos homicídios cometidos por essa corporação. A manutenção desse
destacamento e a nomeação para o seu comando de um dos principais responsáveis
pelo massacre do Carandiru são demonstrações claras de que política de
genocídio da população pobre e preta segue em pleno vigor.
Assim, apesar da importância da
responsabilização pública desses policiais e dos mandatários do Massacre (que,
vergonhosamente, participaram do processo como meras testemunhas), não nos
iludimos com as possibilidades de se fazer justiça dentro do sistema penal, que
é nítida e inescapavelmente voltado à manutenção e ao aprofundamento das
desigualdades produzidas pelo sistema capitalista.
Seguimos na lida cotidiana pelo fim dos
massacres, com a clareza de que as lutas para incidir nas estruturas que
permitem massacres como o do Carandiru, como, por exemplo, pela
desmilitarização das polícias, pelo fim dos extermínios policiais e pela
reversão da política de encarceramento em massa, não cabem nos tribunais.
Como já nos manifestamos outrora: a
derrocada dessa ordem que se sustenta a partir do extermínio do povo pobre e
negro, nos dois lados do muro, e no dia a dia, e da qual o Massacre do
Carandiru é produto e expressão, somente se dará com a organização e a luta
popular contra esse Estado Penal e contra as classes abastadas que dele se
valem para manter seus domínios.
REDE 2 DE OUTUBRO
PELO FIM DOS
MASSACRES
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